... E O ÔNIBUS FECHOU A PORTA
─ Garota, meu amigo, vi em Viena, num restaurante, uma gata, cara! Quer que lhe diga uma coisa?
─ Sim...
─ Ainda não vi, em Viena ou qualquer outra cidade do mundo, pequena que mais me impressionasse. E olhe que eu sou exigente, heim? Mas aquela me encheu as medidas! E, ao lhe ser apresentado, disse-lhe isto!
─Ah! Você, então, chegou a apresentações, a galanteios mesmo ...
─ Apresentações? Galanteios? Romualdo, meu chapa, posso lhe
garantir que eu tenho esta glória ... Bem, mas não precipitemos. Do princípio é que se começa. Estávamos o Cotrim, o Cardoso e eu no tal restaurante. Tínhamos acabado de jantar e estávamos nos preparando para pagar a conta e sair, quando entra a tal pequena acompanhada de uma amiga.
─ Ah! Vinha acompanhada a moça?
─ Sim. Por uma outra a que não prestei atenção, tão absorvido me achava pela primeira, uma loura, de um louro assim ...
Estávamos na fila do ônibus, o tal sujeito que contava a história, o amigo que o ouvia e eu que bisbilhotava a conversa.
Sol quente, rua deserta em bairro longínquo, cabeça vazia de preocupações e aquela voz, por vezes entusiasmada, dando mais ênfase à frase: ─ "uma visão, meu caro!" outras, serena, narrativa, modulada em surdina, a fim de que a atenção despendida para ouvi¬-la possibilitasse uma melhor compreensão do enredo.
─ ... de um louro fulvo. A pele alvíssima. Os olhos enormes e incrivelmente azuis. Um sonho, a pequena! Assentou-se ali, numa mesa, junto de nós. Eu fiquei deslumbrado. Chamei a atenção do Cotrim e do Cardoso:
─ "Meus amigos, que filé!"
Os dois ficaram boquiabertos. Resolvemos adiar o pagamento da conta e a saída. Conversamos, conversamos, prolongando propositadamente os assuntos.
─ ''A loura está te olhando." - disse, de repente, o Cotrim.
─ Eu não acreditei. Você sabe lá o que é uma pequena daquelas,
que só com a sua presença me fizera ficar atônito, começar, sem que ninguém esperasse, a demonstrar interesse por mim? É uma sensação incrível, você pode avaliar?
─ Ah! Certamente!
Tão viva era a descrição, que cheguei a pretender mais uns pormenores sobre a moça: tamanho, talhe, timbre de voz, assuntos que conversava na mesa vizinha, traje, penteado, gestual, charme, lábios, dentes, ouvidos, nariz e garganta.
Cheguei, mesmo, a dar um passo à frente e esboçar um gesto.
Lembrei, porém, da minha triste posição. Silenciei. A narração prosseguiu:
─ O Cardoso, como você sabe, é gentilíssimo e, tendo também observado a queda da pequena por mim e eu abilolado justamente por excesso de interesse, não hesitou: levantou-se, acercou-se da mesa das moças, pediu licença, assentou-se e, loquaz como ele só, pôs-se a parolar com elas. Disse maravilhas a meu respeito, que eu era conde, tinha dinheiro, tinha iate e cavalos de corridas. As meninas ficaram entusiasmadíssimas. Você sabe que, na Europa, dizer-se a uma pequena que o cara é conde, tem dinheiro, cavalos e iate é o mesmo que contar para um brotinho de Ipanema que se possui um carro último tipo ou se fez um teste para galã de TV. A maravilhosa criatura, ao ouvir falar em conde, em cavalos de corrida, em iates, ah! Desmanchou-se em sorrisos e redobrou os olhares pro meu lado.
Em dois minutos, o Cardoso se levantou, e, muito afável, convidou-as para nossa mesa.
─ E elas aceitaram o convite?
─ Aceitaram? Romualdo, elas não queriam outra coisa! Vieram.
O Cardoso fez as apresentações. A danadinha era um filezinho com aqueles olhos azuis fitando-me, plácidos, meigos, profundos. E o sorriso? E o ouro do cabelo a resplandecer? E a conformação do rosto, isto assim de frente a dois passo de mim? E o trejeito gracioso com que me estendeu a mãozinha macia? Meu caro, fosse eu um poeta, soubesse eu captar e poder transmitir todas aquelas minhas emoções, naquele momento! Inspirar-me-iam poemas imensos, que abalariam o mundo.
─ Que pena, não? Perdemos essa obra prima.
─ Não graceje, Romualdo. Era uma coisa indescritível. Disse-lhe
do prazer que tinha em conhecê-la e de como a sua estonteante beleza me fascinara. Ela me interrompeu o cumprimento-declaração.
─ "Pardonl Comment? Qu'est-ce que vous avez dis?" Romualdo, meu caro, a garota não entendera uma palavra do que eu dissera.
─ Mas por quê? Era surda?
─ Nada disso. Não entendia inglês e eu não falava uma palavra
de fran ...
─ Olha o nosso ônibus!
O veículo estacionou. Os dois o tomaram. Eu tinha pressa e o ônibus não me servia. Hesitei um instante. A história me arrebatava, a loura espetacular me fascinava. Estendi a mão para segurar o balaustre. O frescão bufou, cerrou-me a porta na cara e abalou.
E lá se foi a nossa história. A história da pequena alucinante de sorriso transbordante, de porte esbelto, de trejeitos graciosos e olhos azuis translúcidos, que lembravam a limpidez das águas do Arpoador antes que a quilha da primeira nau colonizadora as conspurcasse.
E ali fiquei eu, na rua deserta e tristonha, diante da porta inexorável que se cerrara e do veículo que abalara.
─ Sim...
─ Ainda não vi, em Viena ou qualquer outra cidade do mundo, pequena que mais me impressionasse. E olhe que eu sou exigente, heim? Mas aquela me encheu as medidas! E, ao lhe ser apresentado, disse-lhe isto!
─Ah! Você, então, chegou a apresentações, a galanteios mesmo ...
─ Apresentações? Galanteios? Romualdo, meu chapa, posso lhe
garantir que eu tenho esta glória ... Bem, mas não precipitemos. Do princípio é que se começa. Estávamos o Cotrim, o Cardoso e eu no tal restaurante. Tínhamos acabado de jantar e estávamos nos preparando para pagar a conta e sair, quando entra a tal pequena acompanhada de uma amiga.
─ Ah! Vinha acompanhada a moça?
─ Sim. Por uma outra a que não prestei atenção, tão absorvido me achava pela primeira, uma loura, de um louro assim ...
Estávamos na fila do ônibus, o tal sujeito que contava a história, o amigo que o ouvia e eu que bisbilhotava a conversa.
Sol quente, rua deserta em bairro longínquo, cabeça vazia de preocupações e aquela voz, por vezes entusiasmada, dando mais ênfase à frase: ─ "uma visão, meu caro!" outras, serena, narrativa, modulada em surdina, a fim de que a atenção despendida para ouvi¬-la possibilitasse uma melhor compreensão do enredo.
─ ... de um louro fulvo. A pele alvíssima. Os olhos enormes e incrivelmente azuis. Um sonho, a pequena! Assentou-se ali, numa mesa, junto de nós. Eu fiquei deslumbrado. Chamei a atenção do Cotrim e do Cardoso:
─ "Meus amigos, que filé!"
Os dois ficaram boquiabertos. Resolvemos adiar o pagamento da conta e a saída. Conversamos, conversamos, prolongando propositadamente os assuntos.
─ ''A loura está te olhando." - disse, de repente, o Cotrim.
─ Eu não acreditei. Você sabe lá o que é uma pequena daquelas,
que só com a sua presença me fizera ficar atônito, começar, sem que ninguém esperasse, a demonstrar interesse por mim? É uma sensação incrível, você pode avaliar?
─ Ah! Certamente!
Tão viva era a descrição, que cheguei a pretender mais uns pormenores sobre a moça: tamanho, talhe, timbre de voz, assuntos que conversava na mesa vizinha, traje, penteado, gestual, charme, lábios, dentes, ouvidos, nariz e garganta.
Cheguei, mesmo, a dar um passo à frente e esboçar um gesto.
Lembrei, porém, da minha triste posição. Silenciei. A narração prosseguiu:
─ O Cardoso, como você sabe, é gentilíssimo e, tendo também observado a queda da pequena por mim e eu abilolado justamente por excesso de interesse, não hesitou: levantou-se, acercou-se da mesa das moças, pediu licença, assentou-se e, loquaz como ele só, pôs-se a parolar com elas. Disse maravilhas a meu respeito, que eu era conde, tinha dinheiro, tinha iate e cavalos de corridas. As meninas ficaram entusiasmadíssimas. Você sabe que, na Europa, dizer-se a uma pequena que o cara é conde, tem dinheiro, cavalos e iate é o mesmo que contar para um brotinho de Ipanema que se possui um carro último tipo ou se fez um teste para galã de TV. A maravilhosa criatura, ao ouvir falar em conde, em cavalos de corrida, em iates, ah! Desmanchou-se em sorrisos e redobrou os olhares pro meu lado.
Em dois minutos, o Cardoso se levantou, e, muito afável, convidou-as para nossa mesa.
─ E elas aceitaram o convite?
─ Aceitaram? Romualdo, elas não queriam outra coisa! Vieram.
O Cardoso fez as apresentações. A danadinha era um filezinho com aqueles olhos azuis fitando-me, plácidos, meigos, profundos. E o sorriso? E o ouro do cabelo a resplandecer? E a conformação do rosto, isto assim de frente a dois passo de mim? E o trejeito gracioso com que me estendeu a mãozinha macia? Meu caro, fosse eu um poeta, soubesse eu captar e poder transmitir todas aquelas minhas emoções, naquele momento! Inspirar-me-iam poemas imensos, que abalariam o mundo.
─ Que pena, não? Perdemos essa obra prima.
─ Não graceje, Romualdo. Era uma coisa indescritível. Disse-lhe
do prazer que tinha em conhecê-la e de como a sua estonteante beleza me fascinara. Ela me interrompeu o cumprimento-declaração.
─ "Pardonl Comment? Qu'est-ce que vous avez dis?" Romualdo, meu caro, a garota não entendera uma palavra do que eu dissera.
─ Mas por quê? Era surda?
─ Nada disso. Não entendia inglês e eu não falava uma palavra
de fran ...
─ Olha o nosso ônibus!
O veículo estacionou. Os dois o tomaram. Eu tinha pressa e o ônibus não me servia. Hesitei um instante. A história me arrebatava, a loura espetacular me fascinava. Estendi a mão para segurar o balaustre. O frescão bufou, cerrou-me a porta na cara e abalou.
E lá se foi a nossa história. A história da pequena alucinante de sorriso transbordante, de porte esbelto, de trejeitos graciosos e olhos azuis translúcidos, que lembravam a limpidez das águas do Arpoador antes que a quilha da primeira nau colonizadora as conspurcasse.
E ali fiquei eu, na rua deserta e tristonha, diante da porta inexorável que se cerrara e do veículo que abalara.
Valeu Dr. Edison!
ResponderExcluirPeguei carona na história.
Continue nos brindando com as suas crônicas.
Abraços,
Ildefonso (Dé do Zizinho do Marcílio)
Oo
ResponderExcluirmuito boa ..=)
ResponderExcluirPrezado (a),
ResponderExcluirEstou escrevendo o Livro: "Saudade..." e gostaria de contar com a sua importante colaboração, escrevendo sobre alguma (s) saudade (s) de algo que não existe mais, ou foi modificado, em sua cidade e/ou em outra cidade de sua convivência.
Em Juiz de Fora-MG eu tenho saudades do Cine Paraíso, no bairro São Mateus, Cine Excelsior, na av. Rio Branco, Trem Xangai (que ligava Benfica a Matias Barbosa), bailes no Dream's e em Pádua-RJ eu sinto saudade do Carnaval e das escolas de Samba Diamante Negro, Unidos do Esperança e Arraialzinho, e para cada uma dessas lembranças eu vou descrever as minhas "saudades".
Tenho aqui algumas "saudades" já recebidas:
Eu tenho saudade do...
"Trem de Ferro, da antiga Leopoldina, que passava por Bicas (minha terra natal), transportando passageiros e escoando a produção de café. Acordava cedo só para ouvir o repique do "sino" da estação, anunciando a chegada, ou a partida, de mais um trem de passageiro"
Jorge Rebouças - Engenheiro Civil
Eu tenho saudade das...
"Partidas de futebol que o Santos Futebol Clube, do bairro Floresta, realizava no campo da Fábrica de Tecidos São João Evangelista e que a família Carbogim era base do time, com Zé Alemão, Gabriel e Rafael, além de meu sobrinho Flávio, como mascote"
Manoel Carbogim - Aposentado
Eu tenho saudade dos...
"Bailes de carnaval nos clubes da cidade, na década de 1980, onde a diversão era muito mais sadia.Também tenho muita saudade quando eu apresentava bailes nos clubes de Juiz de Fora e cidades vizinhas. Saudade da eterna rádio Mundial 860, onde sempre buscava os novos hits para tocar no meu programa radiofônico. Bons tempos..."
Carlos Augusto de Oliveira (Guto) - Radialista
Caso tenha alguém de suas relações que queira ou possa colaborar, registrando aqui sua/ou suas saudades, por gentileza, encaminhe esse e-mail.
O livro será lançado aqui em Juiz de Fora no início de 2014, a até a metade do ano de 2014, sera lançado e divulgado em todas as cidades que constarem no mesmo.
Sugestões para:
carlosferreirajf@gmail.com
Grato,
Carlos Ferreira
www.carlosferreirajf.blogspot.com
Juiz de Fora-MG
não ostei muito:foi chato
ResponderExcluirMaravilhosa a prosa de Edison Cattete Reis - filho de Astolpho Francisco dos Reis e Maria Cattete Reis (Miquinha) - Irmao de Carmen Cattete Reis Dornellas. Guidovalense legitimo, levou sua prosa para diversos cantos divulgando o nome de Guidoval.
ResponderExcluirSeja quem for o escritor... lamento que tenha parado
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